Primeira segundona do ano. 16h38. E já estou no consultório mórbido do meu psiquiatra psicótico. Uma maneira boa de se começar o ano: reclamar um monte e ver um cidadão com cara de doido ranger os dentes e me chamar de otário. E ainda pago ele. Coisa de otário.
Escritora compulsiva e com um acúmulo de distúrbios emocionais, tinha o hábito de começar a escrever seus livros sempre com uma frase trágica. Independente do desenrolar da história, a primeira frase, precisava de um impacto lúgubre. Sempre fora assim. Possuía 7 romances publicados, todos com o desencanto no princípio. Como sua vida, diria.
Numa certa manhã, fria como o inferno, como costumava dizer, julgou-se capaz de voar. Absoluto em suas ideias, vagou da cama à janela com passos lânguidos, olhar sedento, a medida que o véu da poluição contornava a silhueta da cidade podre que aprendeu a odiar.
Menina festeira apaixonou-se por sociopata. Um eclipse, uma dança solitária. Tinha os olhos azuis, ele. Mas não brilhavam. Recôndito num mundo paralelo, era senhor ali. Ela, cobria-se de regras, regrava-se posturas, roupas e sorrisos. Saltos desenfreados numa pista qualquer, pés descalços, os dedos emanando gargalhadas. Ele, avulso, olhar indireto refeito por 4 paredes. Conversava sozinho, às vezes. Ela, também.
Era eu mesmo. Num despertar bestialógico. Cansado de noites mal dormidas, de eras mal vividas. Cansado de estar cansado de estar cansado. Era-me eu. Era-lhe eu.
Estava farto de livros de auto-ajuda. Cansado de frases de efeito que entulhavam Facebook. Extenuado de e-mails em massa com mensagens positivas, melosas, otimistas. Seja um conquistador. Seja um vencedor. Seja o rei do mundo… blá, blá, blá. No fundo, achava que tudo não passava de uma tentativa de negar a beleza da simplicidade das coisas. Ou talvez as pessoas só estivessem camuflando o desespero que vive sob seus travesseiros.
De nada adianta teus vis apelos. É frágil tua intempestividade, teus lábios secos. Tua fama decai, teu anelo se esvai. É a pele morta, teu toque sem folículos pilosos. É o agreste em teus olhos, é um selo em tua boca. Roxa. Falsa. Palavras pútridas. Dançando no escuro. Com estranhos. Com fantasmas. Reverenciando teus atos pobres e carentes. Teu andar sofrível. Pauperizadas baratas em teu domínio. Teus olhos magros desperdiçam comédias, acumulam tragédias. É o drama de te acompanhar, e dissecar teu coração. Pedra. Vão. Uma vez em si outra em vão. Um fascínio cego, um amor bastardo. Daqui pra frente, sou eu e meus sonhos. É você e seus fantasmas.
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