Corrosiva

Crônicas corrosivas e gestos de amor

Category: Textos Pequenos (page 2 of 2)

Textos Pequenos da Literatura Corrosiva

Solidão, Ainda

Ela acordou em seu mundo ácido sob a nuvem negra que lhe acompanhara por toda a vida. Parecia-lhe tênue, como sempre foram seus sonhos. Parecia-lhe apenas mais um eco. Apenas um instante que se vence com um passo a mais.

Sempre ouvira, toda sua vida – “tudo passa”. Ela passara, enfim. Como se tudo aquilo que acreditara ser fosse apenas um protótipo, um esboço mal resolvido de sonhos jamais alcançados. Sua vida poderia ser descrita em apenas algumas crônicas pequenas. Nada mais do que isso. Nada mais do que sonhos que se perderam em sua mente distante. Quando se deu conta, a Terra já havia dado outra volta. Sonhos haviam sido criados. Mundos despedaçados.

E ela continuava só.

Crônica Solidão Ainda

Lacuna

Veemente.

Árdua.

Ela queria poder dançar sob o luar, como se pudesse ser a estrela principal, no palco da noite. Queria flutuar, e se deixar partir, como se soubesse que sua falta amarguraria corações. Queria poder gravar-se no papel. Rimada. Eternizada. Como se seu calor pudesse abrasar a ausência de sua voz alada. Como se a cada nova rima, ela pudesse ser lembrada.

Árdua

Veemente.

Infinito passivo

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Sonho é pesadelo

Era um homem sem sonhos. Noites desprovidas de calor, paixão, intensidade. Apenas um  dormir descolorido,  descompassado. Durante o dia, o Nada lhe acariciava. Como uma companhia entediante que não se afasta.  Caminhava horas e horas pelo asfalto, o calor retumbando sua testa engelhada. Esperava a noite, esperanças. Esperava sonhar. Acreditar em elementos desgovernados numa mente livre e criativa. Acreditar ser outra pessoa,  outros planos,  outros toques. Mas, no dia seguinte, apenas o nada. Nenhuma lembrança. Nenhum sonho.

Certo dia, conheceu a garota que só tinha pesadelos. Rapaz sem sonhos conhece menina de sonhos aflitivos. Ele, caminhando distante. Ela, apavorada. Como se tudo o que se movesse fosse ganhar a forma do monstro do último pesadelo, noite passada.

Do contato, nasceu a simpatia. Desta, a dependência. Desta última, o amor. Ele lhe acordava na hora dos pesadelos mais terríveis. Ela preenchia as noites dele com o relato do que sonhara. Noites amenizadas para ela, noites intensificadas para ele.

Eram  caminhos  diferentes  que  se  cruzavam,  e  se alimentavam. Tentavam manter-se, por instantes eternos, na mesma direção. E até poderiam caminhar pela mesma estrada,  mas estavam cientes de que nunca pegariam carona no mesmo caminhão.

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