Esta é a cálida sinfonia. A angústia solutiva que agoniza e retempera as paredes do meu estômago enquanto meus passos já não se sabem qual direção ir. E por que ir aonde ir? As tempestades sussurram navalhas no horizonte, e tento distraí-las com versos e cantigas de ninar. Retumba em meu peito sonhos já não vividos e desapontados. Foram tão distraídos em sua concepção que passaram ilesos, divagando vagas vagarosidades. Hoje, meus sonhos se condensaram no fel que delicada e silenciosamente vaza pelos cantos de meus lábios.
Invadido por variações, ensimesmado em incompreensões, tento gritar as soluções perpetuadas em um caderno de desenhar. Tudo parece tão simples no papel. As discórdias se atenuam ante um risco em verde, propulsões estomacais se acalmam no leve combinar de amarelos e azuis, toques variados de cinza e preto. A agonia quase não se vê no tracejar discreto porque ali sou seu rei e seu herói. Mas quando a lua rasga a cortina, e com um pontapé estilhaça a vidraça do quarto anônimo e bucólico, o que entra é a noite, escura e intimidadora, com um sorriso cínico nos lábios, e sussurrando entre dentes: “Sentiu minha falta?”
Tento gritar o som que tocará tua pele, tento desprender rimas das paredes sujas e frias, como se a noite ainda pudesse, por um instante fração invisível, esquecer-se de minha presença, e me regar a paz que meus olhos outrora já cantaram. Mas é neste beco enleado por cinzas rusgas que meus joelhos tocam desavisados o chão de pedra, enquanto o semblante busca o ar no metro acima.
Os sonhos ainda tentam se erguer, mas tudo o que conseguem é se revolver na lama com cheiro de vertigem. Revoltosos, mas inúteis, acabam se acovardando ante a veracidade da realidade incontestável: nunca fui bom em desenhar sonhos.