Se o amor já era complicado, os criativos fizeram questão de torná-lo um emaranhado ainda mais complexo. Pelo menos, no tocante às declarações de amor.
Tais declarações costumavam ser mais simples e poéticas. Um anel, um pouco de suor frio e gagueira, e um “quero viver para sempre ao seu lado”. Era o suficiente para deixar a amada trêmula, lágrimas aflorando dos olhos. E para que mais do que isso? Bom, mas isso costumava ser em outras eras, quando os dinossauros ainda rondavam soberanos por aí, quando a terra ainda era plana e sustentada por quatro elefantes.
Claro que Afrânio ficou desanimado. Seu amor por Florisbela era sincero, mas não havia residente em seu peito a coragem necessária para se declarar diante de mil pessoas, nem dinheiro para alugar um avião, e tampouco criatividade para elaborar um plano vistoso para surpreender a amada.
Pensou na possibilidade de agir como nos tempos dos dinossauros. Compraria um anel, levaria ela ao parque e diria que queria envelhecer ao seu lado. Mas Florisbela não era bela só no nome. Tinha um sorriso capaz de desestruturar até os mais céticos no amor. Achar que balançaria uma mulher daquelas com apenas um anel e uma declaração sincera era viver uma utopia, e assinar a própria rejeição.
Por isso, Afrânio achou que precisaria ousar, ou o próximo pretendente criativo conquistaria sua amada e o deixaria à deriva.
Assim, Afrânio encheu-se de coragem, apelou para o professor YouTube e resolveu copiar uma declaração de amor com superprodução, embora nada viável para o seu orçamento mendicante. Mas acabou dando um jeito: apelou para um vistoso empréstimo no banco, contratou uma orquestra, uma empresa para produzir faixas, outra para fazer uma chuva de pétalas de rosa e uma terceira para organizar toda a bagunça e dar-lhe um caráter altamente profissional.
E chega o dia da execução, o nervosismo à flor da pele. Na saída da faculdade, tarde da noite, Florisbela foi surpreendida pela orquestra, pelas faixas, pela chuva de rosas, sob olhares de alguns amigos e muitos curiosos. Evidentemente, foi invadida pela surpresa, ceticismo, emoção, e outras expressões faciais que nem os mais íntimos seriam capazes de traduzir. Quando a orquestra parou de tocar a romântica melodia, Afrânio se aproximou e colocou-se de joelhos. Suspiros como que ensaiados reverberaram na plateia. Até que ele se declarou, palavras cuidadosamente escolhidas e copiadas da internet, claro.
O “sim” de Florisbela ecoou durante meses nos ouvidos de emocionado Afrânio, enquanto ele fazia os pouquíssimos preparativos para o casamento, visto que precisou simplificar o que já seria simples. Endividado até o pescoço e com o nome no Serasa, devendo para o banco e para diversas empresas, Afrânio precisou fazer um casamento tão simples quanto aqueles que eram realizados na época em que os dinossauros dominavam o planeta.