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O Conquistador

Decidiu comprar um livro sobre como conquistar as mulheres. Taciturno, tortuoso, não lidava bem com elas. Até hoje, 35 anos nas costas, não fora capaz de conquistar um grande amor.

Por isso, comprou o livro de um especialista. “O Conquistador”, de Michelin Lucká. Que nome! Que sobrenome! Mais de 500 páginas de sapiência amorosa derramado em cada entrelinha.

Correu para casa e começou sua leitura (ele diria, seu “curso”). Pulou o prefácio – dizia que prefácios só enchem páginas, tomam tempo e enriquecem escritores. Não tinha tempo a perder. Afinal, era um desesperado ansioso por colher cada conselho randômico ali distribuído, que mudaria sua vida amorosa por completo. Cobriu as páginas com uma voracidade selvagem em dois dias. Salivou a cada conselho, a cada página que o conduziria a uma nova existência.

No terceiro dia, estava pronto. Era hora de colocar os conselhos em prática!

O especialista dissera: “Vista-se bem. Confira. Reconfira. Peça opiniões. Mulheres gostam de homens que se vestem bem. Se for pra sair com alguma camisa amarelo-cagado que seu avô te deu ano passado, fique em casa e vá assistir TV. Lembre-se: Vista-se muito bem”.  Patético até o osso, foi à balada de terno.

No bar, chegou balançando os braços. Isso demonstra segurança, dissera o especialista. Nada de mãos no bolso, movimentos curtos, passos miúdos. Isso é coisa de frouxo. Machos dominantes se movimentam exagerada e desnecessariamente.

Parecendo mais um boneco biruta de posto de combustível, chegou ao balcão e pediu uma bebida. Gritou, na verdade. Lembrava-se do que havia lido: “Perdedores falam pra dentro. Vivem fazendo as pessoas dizerem: hã? quê? como?”  Por garantia, esgoelou ao pedir um martíni.

Deu mais umas balançadas epilépticas e olhou de lado, para uma morena arrebatadora. Tinha olhos flamejantes pra burro, pensou. Um inferno de bonita. Daquelas que fazem o cara esquecer toda a lição de casa. Mas conseguiu se lembrar do conselho: “Sempre faça barulho. Quando falar, grite. Quando pensar, grunha. Quando bocejar, gema. Quando não estiver fazendo nenhuma dessas coisas, comece a batucar uma mesa, balcão ou o que estiver na frente”.

Coçou a cabeça, e gemeu; coçou o corpo e grunhiu; espreguiçou-se e atroou um longo “ooouuuuuuuuuaaaaaaaiiiiiiaaaaaaaiiiii” bem rouco, parecendo um javali dominante da floresta. Olhou para a morena, tentando imitar o olhar de James Bond.

“No primeiro contato que tiver com uma mulher, nunca diga ‘oi’. Isso é coisa de perdedor. Fale no mínimo 3 ou 4 palavras. Fale frases. Mulheres gostam de homens que falam frases. Nada de interjeições imbecis. Se for pra ficar na base do ‘legal, uhum, puxa, q coisa’, melhor voltar pra casa e comer farinha láctea”. 

– E aí, gata, o que rola?

– Quê???

“Se a mulher perguntar ‘quê?’ com uma expressão de quem acabou de presenciar alguém vomitando, suas chances estão no fim. Se quiser continuar vá em frente – já lidei com muitos teimosos como você -, mas vou avisando: nesse ritmo, acho melhor ligar pra sua mamãe e pedir pra voltar a morar com ela”. 

– Posso te pagar uma bebida?

– Eu já tenho uma – disse, apontando para o copo, evidentemente desinteressada ou apenas fazendo tipo. Sinceramente? Ela não estava fazendo tipo.

Lembrou-se de que o especialista havia dito sobre fazer as mulheres rirem. Mulheres gostam de caras que as façam rir. Uma sacada engraçada era o que ele precisava agora.

– Pois eu ainda não tenho uma bebida. Me paga uma? – E riu. Só ele, claro.

“Se você fizer uma piada e a mulher fizer uma expressão de búfalo em época de seca, com o sol a pino, em pleno verão africano, pode levar este livro de volta na livraria e pedir reembolso. Trabalho com perdedores, mas você já passou da conta”. 

Mas ele não estava a fim de se entregar tão facilmente. Tinha nas mangas um grande trunfo, o grande conselho do sábio que lhe dera forças para estar ali. “Seja sincero. Isto derrete o coração de qualquer durona”.

– Escute, eu não sei lidar muito bem com as mulheres, entende? Até comprei um livro pra aprender um pouco sobre a arte da sedução, mas confesso, acho que não levo jeito pro negócio. A única coisa que sei é que você é de longe a mulher mais linda dentro deste bar, e se for pra levar um fora, quero levar um fora seu.

Ela sorriu. Pensou no que dizer. Isso é bom. “Mulheres quando pensam no que vão dizer é sinal de que…”. De que…? de que…? Ah, dane-se. É sinal de alguma coisa.

– Escute querido. Se está aplicando o conselho de algum especialista, te aconselho a trocar de escritor. Esse aí, com certeza, é charlatão. – E voltou-se para a bebida.

Quanto a ele, magoado, voltou pra casa. Ainda sozinho. Ainda solitário. Para o dia de amanhã, não sabia muitas coisas, nem tinha esperanças. Mas ao menos tinha duas certezas.

Iria à livraria para devolver o livro; e no caminho de volta, aproveitaria pra comprar mais uma lata de farinha láctea.


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