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VIDA – DE ONDE VEIO ESTE SENSO DE HUMOR DOENTIO?

O encanto lhe dosava a face na proporção com que lhe convinham os sonhos. Dia metade, dia todo, a verdade suavizada pelo clamor visceral de suas entranhas.

Nos seus vinte e poucos anos, a vida ainda sondava-lhe perfeição. A eternidade era companhia latente dos passos certos. Mas um certo surto surgiu quando conheceu um homem que acumulava o triplo de seus anos, rugas entrepostas, pele cansada, olhos distantes, cabelos nada convictos. Bons ventos não o trouxeram. E nem os maus o levaram. Entrou em sua vida com aquele exibicionismo solitário, a carência apaixonada, a viuvez lhe decorando o semblante.

Ela, em um estado materno. Uma necessidade nova. Seu calor extra ansiava preencher o frio daquele olhar. Pedia-lhe clemência, o sorriso inexistente. Rogava-lhe atenção, a conduta extraviada. Ele, solitário havia tantos anos, deixou-se aproximar. Deixou-se deixar. Um convite. Um encontro. Um toque. Um beijo.

Nos seus vinte e poucos anos, ela viu a brevidade da vida. Assustou-se com a sensação. Imaginou-se decadente, assim como ele, em pouco tempo. Imaginou-se frágil, doente, sozinha. Não mais se sentia bem. O estado materno cedeu aos pensamentos mórbidos. Otimismo sequestrado, esperança em escravidão. No próximo encontro, diria adeus. Melhor assim. Melhor que um tanto faz.

No encontro seguinte, um bar qualquer, numa noite qualquer, ele não apareceu. Não enviou recados, não deu notícias, não ferveu explicações. Pode ter percebido o mal que fizera a ela. Ou pode ter encontrado paz em outros braços. Muitas dúvidas e poucas certezas.

A vida é assim: prega peças e parece ter um senso de humor doentio.

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