Estendida sobre o chão gélido, amalgamou-se
A pele pálida revelava uma angústia que retumbava seu peito frágil. Sucessão de derrotas que desenhavam uma linha escura sob seus olhos. O mundo que não girava. A alma que não saltitava. O tiro que sempre lhe rompia as têmporas.
Afogou-se em mais um garrafa. Uísque barato. Lutas contra sua própria imagem, seu desconforto desalinhado em céus cinzas e soturnos. Um tombar surdo e seco no piso do banheiro. Acordar horas depois sem saber por que era, por onde estava.
Certa madrugada, na sacada do apartamento, o vento gélido lhe cortando a alma despedaçada, conheceu um universo paralelo. O som da TV ligada. Risadas e música desconexa no aparelho. Virou-se. Atônita, deparou-se consigo mesma, sentada no sofá, uma expressão alegre de uma moça com a jovialidade lhe brotando à pele. Ela mesma, mas outra ela. Uma ela diferente, com outra vida, como se tivesse tomado decisões menos desacertadas. Como se tivesse redecorado poemas e poesias com vicissitudes mais brandas do que suas escolhas funestas.
Aproximou-se de sua projeção, realidade paralela. Notava-se. Notou-se. A outra ela, sentada tranquilamente no sofá, pés esticados. Um olhar despreocupado. Um ocupado senso de prazer.
Mas a outra ela não a via. Ignorava-a. Era apenas ela e a TV. E um sorriso insistente, sincero, que não ousava desaparecer.
– Pode me ouvir? – Quase um sussurro, vida falaz já no fim, pergunta à ela paralela.
Sem respostas.
Contemplou redor e derredor. A casa toda redecorada. Luzes acesas. O olhar jovial. A expressão sorridente. Tudo novo e ela, uma espectadora cansada de cansaços. A personagem inacabada de textos reflexivos.
Sentou-se no chão e ficou admirando-se. Admirada, a jovem cuidadosamente esparramada em um sofá, exibindo uma satisfação com que sonhara toda a vida. Queria aprender, saber o que ela fez para conquistar aquele sorriso.
Estava cansada de estar cansada. E precisava voltar a aprender a sorrir.
Deitou-se no chão frio, e esperou.
Esperando…
Enquanto isso, na sacada, o vento gélido procurava outra alma despedaçada para poder saciar sua sede de vitimar.
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Qm é o autor desta crônica?
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Juliano Martinz.
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e legal
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Sucessão de derrotas que a levou a sentir,um profundo vazio em sua alma , acompanhada de um marasmo.