Em Terra de Cego quem tem um olho é o Josefino, filho do seu Aderbal, que mora lá no final da Vila Real
Desde criança, Josefino era a pessoa mais famosa e requisitada na Terra de Cego. Sendo o único habitante que tinha um olho, não havia uma só alma que não o procurasse em um momento ou outro da vida.
Em Terra de Cego, as festas eram rotina. Nestas ocasiões, as pessoas se produziam. Vestiam as melhores roupas, caprichavam no penteado e maquiagem. Depois, corriam até o Josefino para perguntar o que ele achava. Isso para não falar nas inúmeras vezes em que o pequenino Josefino foi arrastado até as lojas e julgava se as roupas “caíam” bem nos clientes. Se ele dizia “não”, o vendedor cego saía tateando pela loja e trazia outra opção. O cliente só comprava as roupas quando Josefino dava seu ok.
Com o tempo, inteligência mais aguçada, Josefino percebeu que podia ter lucro com a habilidade. Assim, começou a cobrar pela consultoria. Não dava uma única opinião se não lhe pagassem. Acompanhava as pessoas em suas compras, sugeria decoração, opinava na construção de casas, armazéns e palácios. E foi assim que sua riqueza começou a crescer, dia após dia.
Com a demanda sempre crescente, passou a cobrar exorbitâncias. Somente os homens e as mulheres mais ricos podiam lhe pagar. Em certo momento, os nobres passaram a lhe trazer pretendentes apaixonados para ver se eram belos o suficiente para lhes permitir casar com suas filhas. Se Josefino não elogiava a beleza do pretendente, lá se ia um rapaz aos prantos, desiludido e solitário.
Com a riqueza e poder extraordinários, Josefino construiu um castelo. Montou uma gigantesca guarda com mais de mil guerreiros. Passou a erigir monumentos em sua homenagem. E, finalmente, aos 25 anos, proclamou-se rei da Terra de Cego. A partir daí, passou a ser conhecido como Imperador Josefino I.
Certo dia, um viajante com dois olhos chegou a cidade. Ele foi atraído pelas notícias de como Josefino tinha construído um império com apenas um olho. Concluiu: se um olho fora capaz de tornar um homem imperador, dois olhos tornariam-no um deus.
No dia em que o viajante chegou à cidade e anunciou possuir dois olhos, todos foram ao seu encontro. Contrário às suas expectativas, os moradores o agarraram, levaram-no à praça pública e o lincharam até a morte.
Sua morte foi muito rápida. Provavelmente, nem teve tempo de aprender a valiosa lição:
Em terra de cego quem tem um olho é rei. Mas, quem tem dois é uma aberração.