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Briga de Casal

Briga de casal

Casais brigam pelos mais variados motivos. O que torna impossível determinar quem tem razão é que os dois possuem versões altamente convincentes

Versão da Esposa

Certa madrugada, enquanto tomava meu chá na cozinha, em busca de algo que me ajudasse a dormir naquela noite insone, fui surpreendida pela chegada do meu marido. Claro, não havia nada de estranho no fato dele se levantar da cama e ir para cozinha. O problema era que ele ainda dormia. Até ressonava, percebi de imediato.

Ele sentou-se junto a mesa, onde eu estava, e ficou fazendo aqueles ruídos irritantes com a boca, como era costume quando estava no seu sono mais profundo. Até tentei chamá-lo, mas ele não respondeu.

Até que, entre um ruído e outro com a boca, ele disse:

— Eu pegaria um avião, amanhã mesmo.

Tomei um susto. Sonâmbulos falam, é verdade. Mas fui pega de surpresa. Daí, comecei a me perguntar: será que são capazes de entabular uma conversa? Decidi testar.

— O que disse que faria?

— Pegaria um avião. O primeiro!

Uau! Aquilo parecia divertido.

— Avião? — perguntei, achando graça da situação. — Mas avião para onde, querido?

— Para outro país, de preferência.

Que barato!

— E o que vai fazer em outro país?

— Ficar o mais longe possível de você.

Aquilo me desconcertou. Longe… de mim?

— Como assim?

— Preciso de paz. Não aguento mais suas manias, mulher.

De repente, a brincadeira perdeu a graça.

— Manias? Mas que manias?

— Como “que manias”? — O sonâmbulo começou a contar nos dedos. — Você não admite que tolhas de mesa e colchas não estejam perfeitamente estendidas, faz um escândalo quando deixo meus sapatos na sala, quase dá cria quando eu coloco o paletó em cima das camisas no cabide, e fica ainda pior quando guardo louça molhada no armário…

— Ei, alguém nessa casa tem que prezar pela organização, não é?

— … implica com a poeira que só você consegue enxergar nos móveis e bibelôs, me excomunga se deixo o cachorro subir no sofá, entra em desespero quando coloco roupa usada na gaveta, me proíbe de deitar sem escovar os dentes…

— Alguém nessa casa tem que cuidar da higiene, não acha, seu porco malcriado?

— … além de implicar com tudo, absolutamente tudo o que faço.

— Mas… como se atreve?

— Por isso, minha vontade era desaparecer. Para bem longe. Talvez viver no meio dos índios, onde são mais civilizados que você.

— Pois devia desaparecer mesmo, mal-agradecido. Se não valoriza o que tem, então suma. A porta é serventia da casa — completei, bufando, enquanto voltava para o quarto.

Versão do Marido

Acordei naquela manhã e a patroa parecia um porco-espinho. Toda ouriçada, uma expressão de buldogue mal-humorado, nem respondeu meu “bom-dia”.

Mulheres… vai entender!

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