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UMA CARTA PARA FREUD

Crônica - Uma Carta Para Freud

Caro Freud,

Resolvi lhe escrever uma carta porque o senhor anda muito ocupado e eu demoro muito para me fazer compreender verbalmente. Aqui, nesta carta, acho que consigo ser franco e direto. E franqueza é algo que me escapa pelos dedos, especialmente quando estou diante de alguém tão mal-encarado como o senhor (sem ofensas, por favor). Mas se pelo menos o senhor desse um sorrisinho de vez em quando, ajudaria muito nas nossas consultas. Mas enfim…

Hoje resolvi aplicar alguns dos seus conselhos. E outros do Facebook. A propósito, já lhe contei que meu mural parece um livro de autoajuda? Desse jeito, acho que o senhor vai precisar mudar de profissão.

Bom, voltando aos conselhos. O senhor mencionou que eu precisava encontrar prazer no meu trabalho. Pois bem, resolvi espalhar chocolate em todas as mesas, pias, balcões e até no banheiro. Preciso admitir que o senhor estava com toda a razão. De fato, todo o ambiente está mais prazeroso e há docilidade por todos os lados. As formigas também acham.

Romanticamente, a história é mais complicada. Sempre que nos encontramos, o senhor pergunta: “E as namoradas, como vão?”. Realmente, doutor Freud, nunca entendi o porquê do plural. Mas já que tocamos no assunto, acho que precisarei de um pouco mais do que chocolate para resolver este problema.

O senhor disse que o segredo do sucesso é fazer as mulheres rirem. Mas rir de mim também conta? E aquela história de conversar com a garota sobre assuntos que a interessam? Conheci uma garota e já fui puxando assunto sobre rímel, blush, cílios postiços e batom. Não sei não, Freud, mas tem certeza de que esse conselho funciona? A garota soltou um “ihhh” e saiu de perto. Sabe esses “ihs” que podem significar um milhão de coisas e todas elas péssimas para a nossa reputação?

O senhor também mencionou que eu não poderia deixar as garotas me encararem como amigo, não foi? “Mulheres nunca se apaixonam por amigos”. Tentei aplicar este conselho. Uma amiga minha, a Miriam, uma ruiva de um metro e setenta, dois imensos olhos caramelo, dois lábios carnudos que são pura covardia. Pois bem, ela me disse que precisava contar um segredo. Sacou, né? Coisa de amigos, papo de segredos, essas coisas. Não hesitei. Já soltei um: “Nem vem com essas fofoquinhas tolas que me dão nos nervos. Se quiser algo de verdade, te dou um beijo de desentupir pia. Agora se quiser ficar nessas conversinhas frívolas e inúteis, vai procurar tua turma de tagarelas descerebrados”. O senhor poderia ler esta frase novamente e me dizer onde errei? Porque acho que errei em algum ponto, levando-se em consideração o peso do tapa na minha cara.

Ah, meu amigo Sigmund. A vida não é nada fácil. Pela expressão fechada em seu rosto, o senhor deve me entender. Talvez o senhor devesse parar um pouco com esses assuntos melancólicos e se dedicar um tempo a escrever alguns textos humorísticos. Além disso, precisamos conversar mais. Mas não dentro daquele seu consultório mórbido. Podíamos sair para tomar umas cervejas. Ver luzes, ouvir pessoas, essas coisas. Acho que lhe faria bem, também.

Quando quiser, só me avisar. Mas o senhor paga. E não vem com história de que está sem dinheiro, porque aí quem vai dizer “ihhh” sou eu.

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