Quando chegavam ao escritório pela manhã, o senhor Google Pacheco já estava lá. Sentado à sua mesa ou correndo de um lado para outro, mantinha-se no seu memorável ritmo agitado, produção beirando o frenesi.
Os funcionários admiravam-no. Era sempre o primeiro a chegar e o último a sair (embora ninguém tenha testemunhado qualquer um destes acontecimentos).
– Acho que ele dorme no escritório – alguns arriscavam.
– Dizem que ele nunca dorme – outros apelavam.
Senhor Google Pacheco! O chefe do departamento de marketing. Baixinho e rochonchudo. Feição inocente, quase boba. Chamava a atenção pelas roupas de cores vívidas, cintilantes. Geralmente, boné azul, camiseta vermelha, calças amarelas e tênis verde. Às vezes, invertia as cores, mas nunca as abandonava. Roupas estranhas para um homem de nome estranho.
Quando era novo na empresa, ainda apenas um singelo desconhecido, causava confusão com seu nome. Liam o crachá e diziam:
– Bom dia, senhor Gógle.
Ele corrigia, sorridente e simpático.
– Não, não. Pronuncia-se Gúgou.
– Gúgou?
– É a centésima potência do número 10.
– Ah! – admiravam-se. Até o nome carregava seu estigma de gênio absoluto.
Ele era uma enciclopédia ambulante. Parecia ser senhor de todo o conhecimento. Portador de solução para os mais variados problemas na ponta da língua. Para cada desafio proposto no dia a dia da empresa, vertia um turbilhão de soluções precisas e automáticas.
Com sua eficiência derramada a cada suspiro, de auxiliar no departamento de marketing chegou à chefia em poucos meses. Com o passar dos dias e semanas, a experiência acumulando-se nas veias, parecia saber o que as pessoas queriam antes de terminarem de falar.
– Seu Google, o senhor sabe que horas…?
– … será a reunião do conselho?
– Isso. Isso mesmo.
– 16 horas.
Era um gênio. Disposição tamanha, não demorou muito e começaram a abordar assuntos mais pessoais.
– Senhor Google, preciso de sua ajuda. Como faço para con…
– Conquistar sua melhor amiga?
– Como o senhor sabe?
E derramava soluções. Como se não bastasse a prontidão, começou a oferecer várias opções.
– Senhor Google, chocolate dá…?
– Espinha? Celulite? Cólica no bebê?
– Não é isso…
– Sono? Dor de cabeça? Azia?
– Eu…
– Enxaqueca? Energia? Gases?
– Isso – disse, ruborizada. – Gases.
– Ahá. Você está com sorte, menina!
Até o poderoso e inacessível dono da empresa, cuja agenda diária se resumia a constantes viagens de negócio pela Europa, começou a passar mais tempo no Brasil. E quase todos os dias, ia na empresa. Mas nem entrava em sua sala. Já ia direto para a sala do senhor Google. Os curiosos e fofoqueiros discutiam o teor das conversas atrás daquelas portas. Uns diziam que falavam apenas sobre bolsa de valores. Acontecimentos mundiais, tendências econômicas, essas coisas. Outros achavam que a conversa só passeava pela arena dos assuntos pessoais.
Independentemente do conteúdo dos encontros a portas fechadas, a empresa só crescia. E os funcionários eram unânimes em admitir: depois da chegada do senhor Google, a vida de todos eles se tornou mais completa e intensa.
Certo dia, o senhor Google não apareceu para trabalhar. Em um primeiro momento, pairou uma tensão camuflada no ar. Ao passo que as horas passavam, fez-se um clima de desespero. Ligavam para o seu celular, mas dava como número inexistente. Alguém tem o telefone da casa dele? O resultado foi o mesmo: número inexistente. Onde ele morava mesmo? Ninguém sabia. O desespero instalou-se no prédio. Ninguém conseguia fazer nada. Ficavam andando de um lado para outro, perdidos. Nem a dona Gertrudes conseguiu fazer o café.
Durante dias, ninguém trabalhou. Dúvidas sobre o andamento da empresa – diziam que ações da companhia estavam tendo quedas vertiginosas. Os funcionários sentiam-se curvados ante o peso dos problemas pessoais que não conseguiam resolver sem a ajuda e os conselhos do senhor Google.
Duas semanas depois, e a maioria dos funcionários nem mais aparecia na empresa. Dois ou três mergulharam de cabeça no alcoolismo. Outro se jogou da ponte. E o poderoso dono da empresa, quem diria, foi flagrado diversas vezes em prantos, cambaleando pelos corredores fantasmagóricos e mal iluminados da empresa que veio à falência, dias depois.
Quanto ao senhor Google, nunca mais foi visto. Dizem por aí que montou um site e ficou bilionário.
Mas até hoje, ninguém conseguiu confirmar o boato.