Corrosiva

Crônicas corrosivas e gestos de amor

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AMORES VIRTUAIS

Amores virtuais e sentimentos byteanos conjugados em crônicas humorísticas

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TEORIAS E SUBMUNDO DE LARISSA

1

Eu sou Larissa. E vivo no mundo da lua”.

Era mais do que uma frase dita ao acaso, uma brincadeira momentânea. Tornara-se quase um lema, intacto emblema. Os amigos a ouviram diversas vezes. Embora parecesse apenas uma descrição de seu estado mental, a frase de Larissa era, na verdade, enigmática. Dentre tantas outras que ela costumava usar. Larissa é o nome de uma das luas de Netuno. O comentário inteligente e enigmático era interpretado apenas como mais uma das loucuras da menina conhecida por seu comportamento imprevisível e desproporcional ao seu porte de boa moça.

E não parava por aí. Quando chamada de Lari pelos mais íntimos, não perdia a chance de dizer: “Gosto desse apelido. Isso me torna valiosa… pelo menos na Geórgia”. Ninguém entendia, e ela ria. “Bem que ela disse que vive no mundo da Lua…”, alguns concluíam. Seria mais simples explicar que Lari é o nome da moeda oficial da Geórgia. Daria sentido às suas palavras. Mas ela preferia o semblante contrito de seus amigos diante dos seus enigmas. Isso a divertia.

E vivia de fato com a cabeça na Lua. Não era uma garota comum, pouco importando o que esteja subentendido na palavra “comum”. Larissa era quebra de regras. Endeusava detalhes, e ignorava o geral. Fora hiperativa quando criança, quando adolescente, e quando agora, adentrando a vida adulta. Irrequieta. Turbulenta. Intempestiva. Movia-se o tempo todo. Nunca parada. Jamais estagnada. Quando sentada, mexia pernas, remexia quadris, mãos e braços numa dança incessante. Dizia precisar disso. Ela precisava disso. Movimento. Contração de músculos. Todos eles. Dos occipitofrontais aos adutores do hálux. Movimento e respiração. Respiração e movimento. Os músculos faciais não eram exceção. Fazia caretas. Caras e bocas. As fotos a denunciavam. Em cada foto, os próceros, extrínsecos e intrínsecos, ciliares, temporais – todos retesados. Era a bela ou a fera, dependendo do instante do click. Muitas vezes, não se contentava. Apelava ao Fireworks – montagens, balões e textos. A busca do zênite. E sua espontaneidade tornara-se sua marca registrada, um registro de seu bem viver.

Mas nem tudo são flores. Nem mesmo na vida de garotas que vivem no mundo da lua.

2

Numa certa manhã, acordou diferente. Não de toda. Remexeu-se várias vezes na cama, como sempre fazia. Levantou-se num pulo, como sempre fazia. Esfregou com força a mão no rosto como se pudesse arrancar olhos e nariz, como sempre fazia. Mas nesse dia, não cumprimentou o mundo ao seu redor com seu sorriso… como sempre fizera. Acordou com uma estranha sensação. Falta uma gota num oceano, pensou. Imperceptível, mas não está lá. Levantou-se com a estranheza ao seu lado, fazendo companhia. Copiando seus passos. Um clone às avessas. Ela não estava acostumada com sensações como essas. Na sua vida, prezara pela segurança. E de repente, era visitada pela estranheza. Como se esta lhe dissesse que ela não deveria sorrir, exatamente por não ter motivos para isso. Que não deveria mais fazer caretas, porque estava para fazê-las por obrigação, diante dos infortúnios que se lhe aproximavam. Não era uma certeza. Era apenas uma sensação.

E uma sensação como essa tira o sono de qualquer miserável.

Foi trabalhar. Estava apática, distante, oclusiva. Os colegas mantiveram distância. Especialmente Juninho que certa vez tentara fazer uma piada com ela em um período assim, e terminou arranhado. No WhatsApp, colocou uma foto triste. No status, colocou “Ocupado”, muito embora, gostaria que houvesse um “Ocupado, pensando no que dará certo e errado em minha vida”.

E a garota travessa, agitada, enfim, sossegou-se. Sem sorriso, sem caretas, sem movimentos desnecessários. Desta feita, apenas pensativa. A porcaria duma crise existencial, concretude individual? Uma crise heideggeriana ou sartriana? Nada disso. Talvez estivesse apenas se tornando uma adulta. Talvez estivesse apenas consciente de que era hora de agarrar o volante, antes que o carro se perdesse em um precipício qualquer. Num momento de inspiração, abriu o editor de texto, e colocou suas ideias. Não podia perder nada. Eram teorias, até então. Melhor não arriscar. Podiam ser concretizadas. Podiam ganhar formas e cores, adentrar sua casa sem serem convidadas, e não lhe darem ao menos um sorriso de boas-vindas.

Melhor não arriscar.

Uma hora depois. O serviço atrasado. Cinco conversas no WhatsApp esperando uma resposta. E uma janela com animações em flash minimizadas, esperando um pouco de atenção. Mas nada. Ela vivera 22 anos para coisas como essas. Detalhes que podem enriquecer uma vida. Ou talvez, não fazer diferença alguma. Mas agora, ela precisava dar atenção ao geral, ao comum, ao abrangente. Um instante apenas, por favor. Prometo voltar, assim que puder. Se puder… Por isso, ela escrevia, escrevia e escrevia. Não exatamente muito, como possa parecer, embora ainda assim o seja. Mas procurava escrever certo. Invariavelmente, a tecla mais usada do seu teclado, era o backspace. Não poderia haver cálculos errados. Um milímetro à direita ou à esquerda, e o alvo a 10 metros não será atingido. Lembre-se disso.

Três horas depois. O serviço ainda mais atrasado. Clientes começando a protestar. Sete conversas no WhatsApp sem resposta. E Larissa digitando, a língua esbranquiçada escapando pelo canto dos lábios comprimidos, indo e vindo num exercício involuntário do genioglosso. Enfim, ela termina! Num gesto involuntário, soca o ar. Leva a mão ao rosto e o fricciona quase arrancando o nariz. Sorri e diz: “Bom dia, Larissa”.

Quando fecha o documento, este lhe pergunta com qual nome deve salvar o arquivo. Ela pensa, repensa, e digita:

“TEORIAS E SUBMUNDO DE LARISSA”

3

Barbara a olhou com incredulidade.

– Que isso? – apontando a resenha impressa.

Larissa fez sinal para ela esperar. Estava com a boca cheia de chocolate. Pedira sorvete de chocolate com cobertura de chocolate. E comprara uma barra de chocolate para acompanhar. A mesma que devorava agora. A mesma que a obrigaria a uma sessão extra na academia, na próxima semana. Por isso, costumava dizer que chocolates eram sua inspiração e transpiração. Já nem mais os via como chocolates, mas sim como esteira doce, pilates ao leite, cooper com passas.

Quando terminou seu haltere com recheio de avelã, anunciou:

– Se a vida é uma viagem, esse é o meu plano de vôo.

Outro enigma. Ela amava isso. A amiga fez uma careta. E movimentou os ombros num “não entendi porcaria nenhuma”. Larissa se ajeitou na cadeira. Era a sua vez. Seu discurso. Ela estava empolgadíssima. Um, dois, três, valendo.

– Barbara, me descreva sua vida daqui dez ou quinze anos.

– Como assim?

– Não é tão difícil assim, honey. Você nem vai suar. Dez ou quinze anos. Me dê os detalhes.

A amiga dá com os ombros.

– Eu sei lá. Talvez eu…

Larissa dá um tapa na mesa que quase derruba a taça de sorvete e chama a atenção de alguns ao redor. Aponta o dedo lambuzado para a amiga assustada.

– Sem “talvezes”, muchacha. Perguntei como será sua vida, não como talvez ela será.

– Tá me achando com cara de médium, agora? Como vou saber?

Larissa recolhe farelos de chocolate sobre a mesa com o dedo babado e leva-os a boca – não perdia nada.

– Boa pergunta, cowgirl. Como pode saber? Você não tem um plano de vôo. Está rumando sem direção. Entregue ao acaso e ao ocaso. É por isso que elaborei … isso! – Apontou para o papel na mão de Barbara.

– Teorias e Submundo de Larissa? Que porcaria é essa?

– São meus passos para os próximos anos. Todos traçados. Para não haver surpresas. Embora, a Surpresa seja um personagem presente em todas as peças da vida – concluiu, pensativa.

– Por quê Teorias?

– Como toda peça, é permitido improvisações. Nem sempre para mudar o rumo da história. Mas para dar mais graça, mais cor ao roteiro. Não se pode calcular cada letra, cada ponto, se é que me entende.

– Isso não faz sentido.

– Como não? As pessoas fazem isso a todo momento; quando vão abrir uma empresa, quando calculam se poderão pagar uma prestação, os gastos mensais, as férias do final do ano. Os computadores estão cheios de planilhas, Barbara. O que fiz foi estabelecer um plano para… a vida. “Quem de vós querendo construir uma torre, não se assenta primeiro e calcula a despesa…?” – Ela abre os braços e sorri. – Faz todo o sentido do mundo, baby.

– Só na sua cabeça. Por que Submundo?

– Ah, isso aí foi só para soar melhor.

Barbara riu.

– Que loucura!

– É o que sempre digo: me chamo Larissa, e vivo no mundo da Lua.

– Ok, ok. Vamos lá. Vamos dar uma olhada nisso.

4

Dia seguinte.

Uma festa. Casa de alguém, sabe-se lá quem. Larissa presente. Como sempre. Não perdia uma. Uma garota que não consegue ficar cinco segundos sem mover uma perna ou braço não perderia uma festa. Uma necessidade, para ser bem exato. No último ano, passara 4 finais de semana sem festar, e terminara amanhecendo adoecida nas 4 segundas-feiras seguintes. Baixa imunidade. Vulnerabilidade. Ausência de festas deixava seu sistema imunológico paralisado. Pelo menos, na próxima segunda, ela amanheceria com invejável saúde. Foi o que pensou enquanto dançava sozinha, saltitando sobre os pés descalços, e jogando os braços a frente e acima, alternadamente, enquanto a cabeça ia de um lado para outro, como um pêndulo descontrolado. Alguém se esgoelava e desafinava num microfone qualquer, perdido em algum cômodo da casa. E Larissa era toda canção. Sua graça rompia os vasos, se espremia pelos poros, e vazava em forma de luz e composição, atraindo olhares e admiração.

Certamente por isso, Rodolfo se aproximou. E cronometrado. A canção romântica inflou a sala, ela abriu os olhos e ele estendeu a mão num gentil convite. Uma dança entre amigos? Não quando o amigo lança aquele olhar, e esboça aquele sorriso que diz: “Meu lar será o teu lar”.

Larissa olha para a mão dele. Para ele. E para a mão dele, novamente. A canção diz algo sobre “amor que viverá eternamente em nossa louça e tapete”. A mão dele esticada. Ela, um pouco sem graça. Hesita. Estática. A garota que não sabe ser imóvel passou mais de cinco segundos sem nenhum movimento. Um novo recorde.

Sem jeito, ela sorri.

– Um minutinho, guri…

E corre pela casa atrás de sua bolsa. Cadê a maldita bolsa que tava aqui? Bolsas lá e cá. Mas não a dela. Encontra-a, enfim, debaixo da pilha de sapatos tirados pelas irmãs no desespero de não perder nenhuma dança. O plano. Onde está o plano? Cuidadosamente dobrado, no fundo da bolsa. Ela abre. Lá está.

Capítulo 2. Item 3. Parágrafo 1.
“Se um homem ergue a voz um decibel para os pais, vai gritar com sua esposa. Se tossir uma vez sem levar a mão a boca, sempre irá arrotar na mesa de jantar. Se ter o hábito de dar palmadinhas na barriga, vai peidar como um porco”.

Ela arregala os olhos. Essa não! Rodolfo costuma dar tapinhas na própria barriga. Seu plano de vôo anunciando: uma tempestade à frente. Mais do que turbulências. Possibilidade de queda. O plano de vôo não permite adentrar tempestades como essas. Os controladores de vôo entrariam em desespero. Ela também. Preciso de uma nova rota, urgente. Preciso de uma nova rota, droga. Câmbio.

Ela volta para a sala. Passo a passo. Lenta. Pisa em gelo fino. Rodolfo conversa com alguém. Ele a vê chegando, e se reaproxima.

Estende a mão novamente. O mesmo olhar. O mesmo sorriso. A música além da metade. Mas agora, Larissa vê gases ao redor de Rodolfo. Como um vocalista num show de rock. Envolto em nuvens. Envolvido por suas próprias flatulências.

– Onde estávamos? – Ele pergunta, conquistador.

Larissa e um sorriso sem graça. Sorriso social – os forçados que só movem músculos da bochecha.

– Uma outra hora, amigo. Eu preciso ir pra casa.

5

12 horas depois.

Ela devorava um supino branco com flocos quando o celular acusou um torpedo recebido. Era de uma amiga. “E ai? Qbrada da festa? Novis? Vi vc c Rodolfo… Rola love?”.

Larissa recorreu à sua memória.

Capítulo 2. Item 1. Parágrafo 5
“Se uma amiga citar o nome de um homem até 36 horas após a tentativa de aproximação deste, estão em conluio”. Nota ao pé da página: “Neste caso, se estiver cara-a-cara, mude de assunto; se estiverem falando ao fone, desligue; se for mensagem de e-mail ou celular, apague”.

Ela acessou o “DELETAR MENSAGEM” no celular.

Larissa largou o celular, pegou o violão e começou a arriscar alguns acordes. Uma nova forma de aliviar o estresse, botar as fobias para correr. A mãe apareceu no seu quarto quando arreganhava os dedos num fá menor com sétima.

– Chegou cedo ontem.

– A festa não tava lá grandes coisas. – Si maior. Ela odiava pestanas.

– Estranho ouvir isso de você. Logo de você.

– Para a senhora ver como estava ruim. – Ré menor com quarta. Droga, por que não me deram uma flauta?

– Pois é. Entrou com tanta pressa que derrubou … isso – Ela ergue as folhas de papel. As Teorias.

Pressa. Pressa demais. Entrara correndo, lendo e relendo seu manual sobre como usar sua vida pelos próximos anos. Então, onde o perdera? Não se lembrava. Repassou os passos dados. Fora direto pro chuveiro, depois direto pra cama. Levantara nesse sábado, comera chocolate e estava tocando violão. Onde o perdera? Impossível dizer. Precisava acrescentar um item, talvez no capítulo 3: “Se sua mãe pegar isso, vai te encher de perguntas”.

– O que é isso? – ela mesma perguntou, enquanto ganhava tempo construindo respostas para as perguntas que viriam.

– Eu que te pergunto, Lari: onde conseguiu isso?

Não podia mentir. Não sabia mentir.

– Eu escrevi. Gostou? Levo talento para escritora?

A mãe era um rosto petrificado. Difícil definir o que pensava nessas horas. Não era boa coisa, afinal.

Ela pigarreou e leu:

“Parágrafo Único: Se precisar apanhar alguém, e houver um atraso de um minuto, reclame. De dois, faça cara feia e não diga nada. De três, suma e nunca mais dê carona.” Tem outro aqui: “Quando Milena chegar em casa, e suspirar dizendo ‘Ai que fome’, esconda todos os chocolates”. “Se o patrão disser ‘Bom dia’ sem usar o diafragma, fique longe. Se falar de forma bem audível, fique a vontade. Se disser sorrindo, peça aumento”. “Só abra torneiras na casa de outros usando papel-toalha e os germes não farão festa nas suas mãozinhas. Jamais toque em maçanetas”. Esse aqui chama mais a atenção: “Se lhe sorrirem sem usar os músculos extraoculares, devolva o sorriso falso e saia de perto. Nunca confie em sorrisos de bochechas”. O que é isso, filha?

Capítulo 1. Item 4. Parágrafo 2
“Nunca gagueje ao dar uma explicação ou não conseguirá manter-se no controle”.

– Eu… eu… eu…

A explicação se arrastou como um moribundo, mas saiu.

6

Acordou no dia seguinte, se remexendo como se estivesse sendo eletrocutada, deu um pulo da cama, e sorriu para si mesma. Nenhum estranho sentimento, nenhuma torpe sensação lhe tirando a sensatez, a meiga serenidade. Levantou-se, trôpega. Diante do espelho, os cabelos amarfanhados, o rosto amassado, o olho direito pregado pelas amareladas remelas amanhecidas – mas, no final das contas, era autêntica. Ela mesma. Das Teorias, sobraram algumas cinzas. Sim, foram queimadas. Queimara aquilo que lhe arrefecia a espontaneidade. A vida precisa ser vivida por nós, aconselhara sua mãe, e não por equações matemáticas. Larissa, você não é um aplicativo Java, também dissera, mãe-poetisa. E quando sua mãe dissera para queimar as Teorias, Larissa sabia que ela estava certa. Tanto sabia que, no último capítulo, último item, último parágrafo da Teoria, escrevera: “Sempre acate os conselhos de sua mãe”.

Por isso, hoje as Teorias amanheceram como partículas de cinzas perdidas na varanda, sendo tiradas pelo vento para dançar.

Larissa voltou a ser o que era. Voltou a rimar a primavera com o brilho dos seus olhos. Voltou a presentear o mundo com a lhaneza de seus atos. E a agir com a maluquice que compusera sua personalidade. Para os amigos, voltou a ser a garota das caretas, a doida e seus enigmas, a pureza de cabelos descoloridos.

Ela não queria ser muito, nem queria ser pouco. Queria apenas ser presenteada com manhãs de chuva ou manhãs de sol, e então se surpreender com sábias decisões do que deveria fazer. E como fazer. Talvez resolvesse presentear Milena com uma caixa de bombons. Talvez tirasse Rodolfo para dançar. E tudo sem regras. Sem escravidão. A simplicidade deveria ser sua melhor companhia. E a simplicidade seria sua melhor companhia.

Ela não precisava ser necessariamente todo o céu. Desde que pudesse voltar a ser a lua de Netuno e a moeda da Geórgia, isso já lhe bastaria.

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LIGAÇÃO CONTRA O MARASMO

Numa dessas tardes em que penso “Algo diferente poderia acontecer hoje”, um marasmo estocando sua adaga no meu estômago repetidas vezes e, de repente, algo acontece.

O celular toca. Número desconhecido. Um olhar lânguido e uma falta de vontade atender. Hesito. Deixo pra lá. Mas insistências insistentes que insistem insistir me obrigam a atender.

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REINVENTANDO A SÉTIMA ARTE

O cinema, segundo Sean Hartter

A reinvenção da telinha do cinema. A mente de um artista fundindo-se à sua paixão pela sétima arte. Sean Hartter concede asas à sua imaginação e reformula cartazes dos clássicos do cinema, transferindo-os para outras épocas, no passado ou no futuro. Uma viagem lúdica e prazerosa para um mundo onde a arte não impõe limites.

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Sem Título

Escolha um emprego. Escolha um carro. Escolha uma vida. E depois, resigne-se. É a vida, feita de escolhas e consequências. Um passo aqui para um efeito lá. Pode parecer estimulante. Pode parecer desafiador. Ou, às vezes, deprimente.

Por isso, o homem decidiu não escolher coisa alguma. Esta foi sua escolha. Sem razões definidas, sem explicações aparentes. Ele não precisava de escolhas para ser feliz. E não precisava ser feliz para continuar vivendo.

Autodenominava-se O Homem Invisível. Mas não era invisível, apenas existia. Em dado momento, chegou a se questionar: existia realmente? Fazia parte de um plano? Integrava um todo? E se ele não passasse de uma personagem em um livro?

A vida continuava como um marasmo de cores nada vibrantes. Um emprego desestimulante em um escritório qualquer. Sem família, sem raios de sol, sem perspectivas. Tão somente, ratos e restos.

E dia após dia questionava-se, duvidando de sua existência. Era uma pessoa real com sangue, músculos e vértebras? Ou não passava de rabiscos num papel?

Começou a olhar ao redor com desconfiança. O que via era a realidade ou apenas produto da mente de um escritor? Os detalhes à sua volta denunciavam que tudo era irreal. Seu universo não passava de esboços mal definidos escritos no papel. Ele não passava de um personagem deprimido de um livro que certamente não teria um final feliz.

Consciente disso e insatisfeito com seu rumo, decidiu ir atrás do seu autor. Do escritor que lhe privava alegrias. Por que ele lhe dera uma vida tão enfadonha? Por que não lhe conferira alguma fragrância, momentos de alegria, ao menos uma partícula ígnea de bem-estar? Em vez disso, preferira descrevê-lo apenas com o tédio como componente principal.

Na busca, alimentado pelos pensamentos inquietantes, o Homem Invisível se viu dominado pelo ódio. Perdera o controle. Escapara das direções estabelecidas pelo seu autor. Nesta altura, improvisava. Agia por conta própria, contrariando as descrições do autor. O Homem Invisível começou a ganhar forma. Cheiro. Cor. Logo, visibilizou-se. Um ser atuante e perceptível.

Agora, era uma pessoa real. E como tal, poderia se vingar daquele que o trancafiou num mundo sem perspectivas. O Homem Invisível só precisava de uma faca e um pouco de tempo para encontrar seu autor, seu facínora sem coração, e realizar sua vingança.

Encontrou-o numa quinta-feira, 19 de Julho, o pseudo-escritor distraído em seu computador, escrevendo mais uma crônica sobre sua personagem desalentada.

O autor ainda nem havia dado título à crônica. Mas parecia rir. Ria da vida funesta com que fustigava o pobre coitado, personagem sua, criatura sua.

Aproximou-se por trás do autor, sem ser percebido. O Homem Invisível salivava vingança, execrando suor e raiva pelos poros.

Ergueu a faca, e antes que o autor terminasse a frase…

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